Realmente vive-se hoje em um mundo de injustiças,
e a prova disto é a indicação de Lion à Melhor Filme. Se Amy Adams, A Criada e
Elle não conseguiram ser nomeados em suas respectivas categorias, como Uma
Jornada Para Casa pôde ser indicado ao prêmio mais cobiçado do Oscar? Certamente
determinadas coisas não possuem explicações plausíveis.
Podendo ser dividido em dois atos, o primeiro
caracteriza-se pela introdução dos personagens e a impulsão do arco inicial, ou
seja, o drama que é vivido pelo protagonista perante seu desaparecimento e os
confrontos pelos quais tem de passar em sua jornada solo pelas bem
caracterizadas terras da Índia. Absortos pelo carisma e fofura do ator mirim
intérprete de Saroo, o público, durante a primeira etapa do longa, se vê frente
as relações drasticamente e involuntariamente cortadas deste para com sua
família e a vida difícil que passa a levar e complicações pelas quais acaba por
vivenciar, provações que tem de subjugar e o enfrentamento para com o mundo só
o qual não pode escapar. As lutas e perigos os quais tem de lidar basicamente
se resumem a fome, falta de um abrigo decente e estável e bandidos e
comerciantes ilegais que tudo fazem para sequestrá-lo. Vale ressaltar que seu
desaparecimento sofre uma sutil influência do cotidiano árduo e miserável de
seus familiares (quem já assistiu a película entenderá). Ademais, a primeira
metade do filme (ou quase isso) também é marcada pela inclusão de Saroo a uma
nova vida, cultura e costumes conforme sua adoção por um casal de australianos,
além do início de relacionamentos que virão a ter sua importância na vida do
indiano. Ainda referente ao dito plot, seus pais adotivos igualmente tomam sob
sua tutela outra filho, este que é a mais pura, real, sofrida e dolorosa personificação
dos traumas e feridas deixadas por todos os confrontos que uma criança da cuja
idade mínima tem de passar até o respectivo momento e como estes são extremamente
impactantes e influentes de forma maléfica para o resto de sua vida.
Já o segundo ato, quando Saroo se encontra
adulto perante um salto no tempo (estes que são comuns no entrecho, mas não
pesam e somente o complementam) de 20 anos, é notório pelos conflitos pessoais
que passa consoante o dilema acerca de seu saudosismo, dilema muito bem
incorporado e que muitas pessoas com uma história similar enfrentam. Ademais,
sua crise emocional engloba deslumbrantemente todos seus medos, receios e atritos
em relações para com pessoas de seu círculo íntimo. Marcado por uma carga dramática
e psicológica bem alta na qual a complexidade de cada personagem se realça mais,
o ato em questão exige bastante dos atores, estes que conseguem convincentemente
entregar uma excelente performance sentimental e empenhada onde o ápice de suas
atuações são ditadas por emoções condizentes e passagens as quais a doída dramatização
chega a ser palpável e contaminante, não à toa Dev Patel (que levou o BAFTA de
Melhor Ator Coadjuvante) e Nicole Kidman conseguiram justas indicações em suas respectivas
categorias. Provavelmente o diálogo de maior destaque se encontra em uma
sequência quando ambos os personagens interpretados pelos nomeados ao Oscar discutem
a respeito do motivo da adoção do protagonista e seu "irmão", diálogo
que se sobressai conforme as reflexivas e conscientes justificativas.
Durante a metade final do longa, flashbacks e
lembranças passam a ser utilizados pelo roteiro, estes que enfatizam a boa,
amigável e fluida relação fraternal do intérprete de Patel para com seu irmão
biológico, vínculo que não funciona entre os adotados. Recurso muito bem
utilizado que ratifica o que o protagonista deixou para trás em sua antiga vida
e agora lhe serve como estímulo para o reencontro familiar, além de salientar o
drama que é reforçado ao longo de toda nova tentativa falha ao não ter seu foco
concretizado. Neste segundo seguimento da película, a trama impõe como aliada de
Saroo a tecnologia, método para se chegar ao seu objetivo que merece ser
destacado, afinal, quantos no passado não poderiam ter tido seu desejo
realizado tendo a internet como companheira?
Emocionante e tocante, Lion pode se vangloriar
de sua admirável trilha sonora que dialoga exemplarmente com seu teor corrente (outra
justa indicação ao Oscar) que igualmente possui o dom, sem se tornar um fardo,
de se alterar bem e de tal maneira harmônica consoante a situação, ademais da
bela e exuberante fotografia (que lhe rendeu mais uma nomeação plausível) e
iluminação que são bem coordernadas ao correr do enredo, assim como a boa escolha
de atores consentânea que condiz com os aspectos originários de cada povo
explorado na produção. Além, algo que deve ser lembrado é o curioso título do
filme, este que é autoexplicado ao desfecho do mesmo.
Todavia, nem só de rosas Uma Jornada Para Casa
é constituído. Baseado em fatos, o longa não inova referente ao contexto
abordado, apesar da bela história de perseverança, sonhos, superação... este
cai em diversos clichês e não apresenta ousadia quando tem a oportunidade, você
já conhece o que vê na tela. É certo que possui como fonte de inspiração
acontecimentos verídicos, porém a trama não tem de ser 100% voltada para estes.
Além, tem sua maior falha presente na passagem do primeiro para o segundo ato que
é abordada sem a sutileza necessária, o espectador se vê diante de um ritmo
entrecortado de forma drástica e sem a preparação sensata, poderia funcionar,
mas faltou competência do diretor, cadência, versatilidade, destreza, um
desenvolvimento de maior cuidado, apreço, sutileza e sensibilidade pelo diamante
bruto que tinha em suas mãos. Enfim, as fragilidades do roteiro ofuscam grande
parte do brilho que poderia ser bem mais resplandecente.
Em suma, considerando que tinha grandes expectativas
para o filme, creio que tenha deixado minhas expectativas se elevarem demais e,
perante o esperado não encontrado, o amargor tenha sido demasiado desgostoso.
No mais, Lion pode ser um bom filme, mas não é necessário e logo será esquecido.
Matheus
J. S.
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Ficha Técnica (Adoro Cinema):
Data de lançamento (Brasil): 16
de fevereiro de 2017 (1h 58min)
Direção: Garth Davis
Elenco: Dev Patel, Rooney Mara,
Nicole Kidman…
Gêneros: Biografia; Drama;
Aventura
Nacionalidades: Eua, Austrália,
Reino unido
Avaliação:
IMDb: 8,1
Rotten: 86%
Filmow (média geral): 4,2
Adoro Cinema (usuários): 4,3
Kontaminantes (Matheus J. S.): 8
Lion é relevante por explorar tópicos de interesse de nossos tempos, como a evolução tecnológica. Convida o espectador a pensar e promove boas discussões sobre a globalização e sincretismo cultural. É interessante ver um filme que está baseado em fatos reais, acho que os filmes baseados em fatos reais são as melhores historias, porque não necessita da ficção para fazer uma boa produção. Também gostei muito de Dunkirk, não conhecia a história e realmente gostei. Parece surpreendente que esta história tenha sido real, considero que outro fator que fez deste um grande filme foi a atuação do ator Tom Hardy, seu talento é impressionante.
ResponderExcluirOi Emma, obrigado pelo comentário. Apesar de não ter gostado de Lion, reconheço que o filme possui algumas vertentes reflexivas que podem ser aproveitadas. Referente à Dunkirk, não curti o longa pelo tom abordado o qual o diretor optou por tratar o enredo, apesar de ter gostado bastante do Tom Hardy, em minha opinião, um dos melhores atores dessa geração. Segue a seguir o link da divagação de Dunkirk:
Excluirhttps://kontaminantes.blogspot.com/2017/12/dunkirk.html