16 de setembro de 2018

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Atypical (1ª Temporada)

Tv


Consoante a enxurrada de filmes e séries apresentada pela Netflix todo mês, é impossível acompanhar tudo e inevitável que certas preciosidades passem despercebidas. Pois bem, este é o caso de Atypical, produção original do serviço de streaming que merece muito mais atenção e alarde do que vem recebendo.
Dentre seus grandes trunfos, o desenvolvimento de uma estória leve em prol da confecção de reflexões extremamente atuais e relevantes certamente se mostra um de seus principais pontos. Fomentada por uma trilha sonora lúdica e versátil na transição de suas tonalidades (ênfase para o toque de Cane Shuga do Glass Animals), breve duração dos episódios, personagens carismáticos e hilárias analogias feitas por Sam relacionadas a típicos eventos de seu cotidiano, Atypical propõe a comicidade como cerne da leveza de seu roteiro, e é uma aposta extremamente eficaz desenvolta com proficiência. Isto é, sem deixar-se levar pela morbidez dos temas apresentados, a série imprime o bom-humor como veículo de comunicação ao espectador, deixando-o pensar e questionar sem o peso alarmante de sequências densas, o que permite uma maior amplitude de público e uma trajetória light que, mental e emocionalmente, cobra pouco de seu assistente.
Esta ínfima cobrança não mostra-se um aspecto negativo, muito pelo contrário, é um eficiente gatilho estrutural que, ao passo que se expõe situações penosas, vê a jocosidade tecer um dueto narrativo que torna o entrecho mais palatável e contagiante. Tal jocosidade é efetuada de forma fluida, seja nas várias circunstâncias cômicas que permeiam as atividades diárias de Sam e sua família - estas de fácil assimilação do espectador conforme o tom rotineiro do enredo -, seja nos modos e costumes singulares de Sam inerentes a seu autismo que geralmente vão contra os padrões de normalidade social. Esta acometida só demonstra eficácia por conta do elo estabelecido entre público e protagonista que vai além das metáforas feitas por Sam envolvendo pinguins e a Antártida, abrangendo desde uma narração em voice over que possibilita uma maior compreensão e proximidade com o personagem, até a utilização de uma estética que esporadicamente enaltece a concentração de sons, luzes e uma câmera inquieta com enfoque em planos fechados que põe o assistente sob a mesma perspectiva do Sam ao lidar com as angústias que o afligem.
É a partir desta imersão diegética que se articula as críticas da série, estas voltadas ao bullying, exclusão social, pressão a se seguir parâmetros considerados bem-vistos e avaliados, e a incessante necessidade de ser aceito que contrastam com as mensagens de igualdade, empatia, individualismo como forma de reiterar suas próprias qualidades e inclusão independente das diferenças. Atypical, sobretudo, é um minucioso estudo de personagem que trata-se das descobertas de um adolescente que recém-adentrou a fase adulta, como este encara a sociedade imbuída por preconceitos, e como encara a si mesmo. Nesta arremetida, a série é divertida e delicada ao representar todas as dificuldades enfrentadas e vencidas por um jovem "deslocado" absorto por um mundo que se mostra repleto de experiências a serem exploradas, mesmo com todos empecilhos e contratempos a serem sobrepostos; assim sendo, Atypical é um belo e inspirador exercício de autoconhecimento.
Todavia, Atypical não é apenas sobre Sam, mas também sobre como seus familiares se portam tendo um autista em seu círculo de convívio. Para execução da respectiva acometida, o programa dosa conscientemente um tempo significativo para a ideal abordagem de seus arcos, cada qual destrinchando as diversas facetas sentimentais humanas que vão desde culpa, rancor e solidão, até a mais radiante felicidade, alegria e estima. Os personagens secundários também estão bem, realce para Zahid que proporciona alguns dos momentos mais engraçados da temporada, e para Julia, figura simpática quando adjacente ao plot central, mas que jamais funciona quando o script tenta lhe atribuir camadas; é uma personagem que nunca encontra seu lugar e acaba saturando a trama. Ademais, vale ressaltar que a dinâmica entre as personas é simplesmente incrível, orgânica e cativante.
As interpretações em Atypical são outro grande destaque. Keir Gilchrist está impecável como Sam, seja nas particularidades gestuais, maneirismos, trejeitos e hábitos que englobam seu espectro autismo, nas expressões faciais que delatam uma personalidade confusa e acanhada, contudo sedenta em se fazer parte do grupo, bem como na maleabilidade de sentimentos e na transparência de conflitantes e reprimidas emoções que o acompanham diariamente; não há como o espectador desacreditar que ele é um garoto ímpar que, acima de tudo, busca entender e ser entendido pelo universo que o cerca. Jennifer Jason Leigh incorpora com aptidão uma mãe exaurida que jamais pode se mostrar abalada ou vulnerável, que não consegue se desvencilhar de suas preocupações e receios maternos, porém que se mantém atenciosa e amável com a família, ainda que sufocada na própria rotina e em dilema com suas escolhas; todos seus medos e anseios chegam a ser palpáveis. Brigette Lundy-Paine convence na pele da irmã afável, irritante e superprotetora, que se chateia por ser frequentemente deixada de lado, mas que compreende as necessidades do irmão, e Michael Rapaport não compromete como um pai em descoberta do próprio posto e na admissão de seu filho.
No mais, Atypical desponta como uma das melhores séries da Netflix, que preza pautas de suma relevância social e que pode ser vista e debatida por todo e qualquer tipo de público.
Matheus J. S.

Assista e Kontamine-se

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Ficha Técnica:
Primeiro episódio: 11 de agosto de 2017
Criado por: Robia Rashid
Com: Keir Gilchrist, Jennifer Jason Leigh, Brigette Lundy-Paine…
País: EUA
Gênero(s): Comédia; Drama
Status: Em Andamento
Duração (aproximadamente): 30 minutos

Sinopse (Netflix):
Quando um adolescente com traços de autismo resolve arrumar uma namorada, sua busca por independência coloca a família toda em uma aventura de autodescoberta.

Avaliação (1ª Temporada):
IMDb (2017- ): 8,3
Rotten: 76%
Metacritic: 66%
Filmow (média geral): 4,3
Adoro Cinema (usuários): 3,5
Kontaminantes (Matheus J. S.): 9,5
Avaliação

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