2001 - Uma Odisseia no Espaço é um filme chato,
de extrema importância, complexo e confuso. Sim, todos estes adjetivos podem
ser atribuídos a esta grande preciosidade do século passado. É certo que nem
tudo que é bom seja legal, nem tudo que é relevante seja interessante, e que
nem tudo que é belo seja atraente, argumentos devidamente apropriados quando o
assunto é o longa em questão. Contudo, primeiramente, para poder divagar e
entender um pouco da grandiosidade desta película deve-se compreender o período
sob o qual foi produzida.
Considerando que a Guerra Fria, um conflito
ocorrido somente no campo diplomático entre as duas maiores superpotências do
mundo que se iniciou após a Segunda Guerra Mundial abrange uma quantidade de
aproximadamente 50 anos de confrontos, esta possui em seu currículo uma extensa
grade de importantíssimos acontecimentos, como, por exemplo, a Crise de Mísseis
de Cuba, a Queda do Muro de Berlim e a icônica Corrida Espacial. Resumindo,
esta foi a responsável por levar o homem pela primeira vez a pisar na lua, mais
especificamente um astronauta estadunidense. Fato interessante e extremamente
controverso, pois os EUA se encontravam atrasados com relação ao conflito em
questão, visto que a União Soviética já havia feito com que uma cadela orbitasse a Terra.
Desta forma, não se deixando para trás, finalmente o pessoal das terras do Tio
Sam obtiveram sucesso na enviada do homem ao satélite natural de nosso planeta, o que
basicamente lhes proporcionou a vitória da Corrida Espacial e um gigantesco
passo a frente de seu inimigo na própria Guerra Fria em termos de tecnologia e
popularidade frente aos olhos do restante do mundo.
Certo, mas o que tudo isto tem a ver com o
filme? Como se sabe, consoante as inúmeras reflexões e temas abordados pelo
longa, a exploração do espaço é uma delas, o que neste resulta impecáveis e até
mesmo inacreditáveis efeitos visuais para a época. Perante isto, levando-se em
consideração que o lançamento da película se deu em 1968 e a ida do homem a lua
um ano depois, muito se especula a respeito desta ter sido uma farsa
arquitetada por Stanley Kubrick (diretor) e o governo dos EUA para estes se
consolidarem a frente dos soviéticos na guerra, umas das mais populares e
intrigantes teorias da conspiração que muitos alegam ter sido confirmada em
outro filme do cineasta, O Iluminado, mas isto é assunto para outra divagação.
Da mesma forma, relacionado à similar quesito, o longa é um espelho da ideia
que a sociedade da época possuía de como seria o mundo daqui aproximadamente 30
anos em relação à exploração do espaço. Como vimos, acreditavam que já teríamos
visitado até mesmo Júpiter. Além, a película se realça ainda mais por conta de
seus já citados efeitos visuais (antes nunca vistos e, talvez, sequer
imaginados) que revolucionaram drasticamente a sétima arte (não à toa estes lhe
renderam um Oscar) e fez com que esta fosse vista sob nova perspectiva, se o
cinema é o que é hoje, muito se deve a 2001. Esta obra com certeza está entre
umas das mais influentes e revolucionárias da história, ao lado de nomes como
Cidadão Kane e Casablanca.
Com uma sequência inicial de aproximadamente 3
minutos de pura escuridão, o que já realça o sentido de mistério e incógnita
estabelecido, o longa segue aproximados 20 minutos sem diálogos e seres
humanos, somente o foco voltado para primatas e um monólito negro que aparece
repentinamente. Pode-se dizer que esta passagem se destaca bastante, não
somente por seus acontecimentos e a inclusão do artefato que será notório ao
longo de toda a trama, mas por suas reflexões impostas que abrangem desde o
desenvolvimento da vida até uma sutil sugestão enigmática a respeito do contato
extraterrestre para com a Terra a milhares de anos. Em certos aspectos, o ponto
ressaltado me lembra, de certa forma, quesitos do recente A Chegada (leia aqui). Ainda em relação
ao contato alienígena, este se mostra imensamente interessante, até porque
Kubrick, ao decorrer de suas pesquisas, acabou por ter uma conversa com Carl
Sagan a respeito da vida fora do planeta, o que lhe acarretou a informação do
próprio que a vida alienígena de qualquer maneira introduzida na tela
semelhante a humanos não estaria próxima da verdade, pois, segundo Carl, seria
improvável a vida fora do planeta se assimilar a vida terrestre. Toda e qualquer
tentativa de uma representação não passaria de mera falsidade e irrealidade.
Não se preocupe, isto não é bem um spoiler, apenas um alerta para que não eleve
demais as expectativas para a película a espera de aterradores aliens.
Igualmente mais pra frente voltaremos a falar do Kubrick.
Após os cruéis, chatos e reflexivos primeiros
19 minutos do filme (ou quase isso), este, em uma das cenas mais clássicas da
história do cinema, dá um salto no tempo de mais de 3 mil anos ao fazer uma
alegoria a evolução da ferramenta (saltos estes que serão comuns, não de 3 mil
anos, mas sim saltos no tempo). Seguindo uma trilha sonora erudita e clássica,
prevalecendo um roteiro cuidadoso e bem específico regido simultaneamente por
Stanley e Arthur C. Clarke (que na época escrevia o livro homônimo) onde até os
mínimos detalhes têm um propósito (o que me recordou Donnie Darko [leia aqui]), 2001 presa
reflexões que vão desde a vida e questões existenciais até a evolução
desenfreada das máquinas (fator sobre o qual se pode traçar certo paralelo com
Ela [leia aqui], longa estrelado por Joaquim Phoenix), além de certas reflexões já
ressaltadas.
Relembrando em certos quesitos grandiosas
películas como Star Wars (refiro-me aos incríveis efeitos visuais e passagens extraplanetárias),
Interestellar (a complexidade se enquadra como aspecto similar) e Contato
(digamos que a relação entre alienígenas e humanos seja o fator semelhante),
Uma Odisseia no Espaço com certeza não é um filme pra qualquer um e, para assisti-lo,
sem dúvida é necessário muita paciência, ademais de seguir um ritmo lento e
arrastado com poucos diálogos (o que não o impediu de ser indicado a 4 Oscars).
Além, na época de lançamento foi muito criticado, não se tornou um grande sucesso
comercial (várias pessoas chegaram a abandonar as salas de cinema) e conquistou
o status de incompreensível (o que para muitos ainda o é).
Sendo um dos filmes mais distintos, peculiares
e intrigantes do século passado, 2001, um longa muito além de seu tempo que
levou cinco anos para ser feito e não recebia apostas de ninguém, gradativamente
passou a ser prestigiado e hoje é considerado um dos maiores expoentes do
universo cinematográfico, eleito por muitos simplesmente o melhor filme da história.
Ademais, com referências históricas e uma passagem na qual uma partida de
xadrez se destaca, o longa pode ser dividido em três atos que requerem total
atenção até com os mínimos detalhes para uma melhor compreensão de sua essência
e propostas. Apesar de não se mostrar extremamente confuso ao seu decorrer,
certos aspectos o complicam e o desfecho certamente corrobora com a confusão ao
“bugar” toda percepção e plausível entendimento que estava se estabelecendo.
Ainda referente ao desfecho, determinadas sequências próximas ao final se
ressaltam pela insanidade apresentada e dúvidas deixadas, o que praticamente se
resume a um jogo de cores que se realça e aproximados 10 minutos de loucas
imagens psicodélicas. Além, a última cena pode ser, facilmente, considerada
umas das mais complexas e interrogativas da história do cinema.
Único, clássico, ousado, filosófico e, ao mesmo
tempo, atual, realista e futurista, ademais de todos quesitos enfatizados, Uma
Odisseia no Espaço similarmente expõe a maestria presente na condução de
Kubrick e mais uma vez seu talento e genialidade ao lidar com temas e gêneros
distintos. Como este foi o primeiro longa que conferi do diretor, após, em
outra produção vista, pude confirmar, com admiração e brilho, a versatilidade
do mesmo ao mudar de ares. Repleto de questões interpretativas, a película,
segundo o próprio Kubrick e Clarke, teria sido falha se alguém a compreendesse
de primeira. Além, ressaltemos que o filme e o livro possuem um sucessor, não
renomado, porém que dá continuidade a 2001, assim como um terceiro volume que
quase foi adaptado para os cinemas encerrando a trilogia. Outro fator de
destaque se enquadra à dita, por muitos, injustiça que o longa teve o desprazer
de viver ao não receber o Oscar de Melhor Filme daquele ano. Penso que o
equívoco seja comum e normal, pois, como já dito, a película está muito além de
seu tempo e levou anos para ser merecidamente reconhecida. Desta forma,
imaginemos quantos outros filmes recentes ou que ainda serão lançados passarão
batidos e em um futuro não muito distante possam ser produções reputadas e
consideradas injustiçadas sob o período concebidas. A perspectiva, o conhecimento
e a compreensão mudam com o tempo.
Em suma, 2001 - Uma Odisseia no Espaço não é
recomendado se procura diversão, mas sim se deseja se propor um desafio e
viajar pela história da sétima-arte e campos antes nunca explorados. Com
certeza uma das experiências mais peculiares vividas por mim referente ao
expansivo, abrangente e magistral universo cinematográfico.
Matheus J. S.
Assista e Kontamine-se
Comente e Siga Nosso Blog
Avaliações:
IMDb: 8,3
Rotten: 94%
Fimow (média geral): 4,2
Adoro Cinema (usuários): 4,5
Kontaminantes (Matheus J. S.): 9
Ficha Técnica Resumida (Wikipédia):
Estados Unidos / Reino Unido
1968 • Metrocolor • 142 min |
|
Direção
|
Stanley Kubrick
|
Produção
|
Stanley Kubrick
|
Roteiro
|
Stanley Kubrick
Arthur C. Clarke |
Elenco
|
Keir Dullea
Gary Lockwood William Sylvester Douglas Rain |
Gênero
|
Ficção Científica
Drama |
Cinematografia
|
Geoffrey Unsworth
|
Edição
|
Ray Lovejoy
|
Companhia(s) produtora(s)
|
Metro-Goldwyn-Mayer
Stanley Kubrick Productions |
Distribuição
|
UK
Metro-Goldwyn-Mayer
EUA
Metro-Goldwyn-Mayer
|
Lançamento
|
UK
2 de abril de 1968
EUA
2 de abril de 1968
|
Idioma
|
Inglês
|
Orçamento
|
US$ 10.5 milhões
|
Receita
|
US$ 190 milhões
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário