1 de março de 2018

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12 Anos de Escravidão

Pôster


O período escravocrata é um dos episódios mais pútridos e chocantes da história da humanidade, isto é indubitável. Mediante o racismo que ainda predomina sobre pessoas unidimensionais e preconceituosas, este é um tema que não deixa de ser extremamente contemporâneo, frequentemente discutido em mídias sociais, documentários... e no cinema. Enfim, 12 Anos de Escravidão é mais um que se apropria de tal pauta.
Baseado em fatos, a história contada em 12 Anos de Escravidão, não bastasse o denso contexto, ganha ainda maior realce pelo aspecto ressaltado. Seus primórdios, que se alternam entre takes da vida de Solomon como um homem livre e como um escravo, servem para ratificar o impacto das circunstâncias calamitosas em que o personagem se encontra, além de conceber o desalento contraste da percepção de Solomon entre o que foi e o que é. Logo no início do filme o espectador também se vê apresentado à figura do Ford, um senhor de escravos gentil que se apieda das situações de seus semelhantes, mas que se vê partilhando e contribuindo para continuidade daquela vida e que nada faz a respeito por conta dos paradigmas sociais vigentes, o que incumbe interessantes reflexões de teor moral e ético ao assistente.
12 Anos de Escravidão, como uma produção similar faria de praxe, também se aprofunda no horror da época em retrato. Embora bastante violento, com sequências de pura angústia que clamam compaixão, este não é um longa que se aproveita da violência manipulativa para sensibilizar seu público, mas sim de fatores sugestivos e da naturalidade com que os eventos estarrecedores se desenvolvem sob panorama dos brancos. Seja no levar de um negro para longe, as cicatrizes que lhe tomam o corpo, a melancolia que lhes assola com o passar do tempo imutável em suas vidas, na tensão ocasionada pela equívoca execução de uma tarefa diária passível de dolorosa punição... ou na forma com que seus corpos são objetificados, no modo banal com que seus sentimentos são vistos, na maneira animalesca e ignorante com que são tratados vivos ou mortos... é uma película crua e brutal tanto em perspectiva visual quanto comportamental.
De elenco grandioso e renomado, 12 Anos de Escravidão é protagonizado de um lado por Solomon vivido por Chiwetel Ejiofor, este que interpreta brilhantemente a transformação de um homem obstinado e rebelde a um completo serviçal que se vê amargamente envolto por aquele mundo, mas que interiormente ainda mantém esperanças e o espírito civilizado, e do outro por Edwin Epps, magistralmente incorporado por Michael Fassbender que adere a seu personagem requintes lunáticos e uma personalidade inflexível, maldosa e maliciosa que, no tempo que Chiwetel tem seu trabalho realçado pelo palpável trabalho de expressões faciais martirizadas, Fassbender salienta seu caráter por meio de olhares perversos, frases permeadas por seu senso de menosprezo e superioridade e atitudes nefastas. Enquanto Solomon simboliza a esperança, Epps representa o exaspero e o desconsolo. As atuações de Lupita Nyong'o e Sarah Paulson também merecem ênfase. Sarah, como Mary Epps, desempenha um papel símil a de seu marido, mas que se sobressai principalmente pelo ciúme, inveja e ódio intrínseco a seu âmago deteriorado. Já Lupita, como Patsey, tem uma performance bastante corajosa, de submissão e insurgência simultânea, constantemente alvo de torturas, maus-tratos e lancinantes degradações físicas e emocionais.
Tecnicamente falando, o filme igualmente não se deixa para trás. Ao optar por extensos planos-sequência, o longa imprime maior genuinidade a sua trama, se destacando, próximo ao fim, uma tomada de textura visceral e direção impecável, onde, durante um intenso castigo, a câmera ronda o ambiente e captura distintas óticas do acontecimento, seja Edwin como um carrasco movido pela fúria, Solomon atônito, desesperado e em impotente aflição, Mary em pernicioso regozijo de suas próprias ações e Patsey em extrema dor, humilhação e sofrimento. A trilha sonora, tanto extradiegética quanto a diegética cantada pelas personagens, é enternecedora, e a fotografia, em sublinho dos cenários bucólicos, das sofisticadas mansões e da miséria que acerca as vivências dos escravos, é belíssima e se coopera ao figurino característico e o design se produção detalhadamente real.
Em meio a suas acometidas reflexivas, a película tem passagens que enaltecem a Bíblia como justificativa para os revoltantes atos vistos em tela, outra boa alfinetada que também remete ao passado no que diz respeito ao “direito divino dos reis” e que de forma semelhante encontra seu espaço nos dias de hoje. Em contraparte, ao tentar expor uma visão igualitária e crítica aos métodos racistas em destaque, o entrecho se mostra demasiado compelido e expositivo. Não precisava de um personagem bonzinho e diferentão que vocaliza tudo que já está sendo expresso e digerido apenas por imagens e situações rotineiras.
No mais, 12 Anos de Escravidão é um filme forte, pungente e que mesmo sem ser original, é muito bom.
Matheus J. S.

Assista e Kontamine-se

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Ficha Técnica (Adoro Cinema):
Data de lançamento (Brasil): 21 de fevereiro de 2014 (2h 13min)
Direção: Steve McQueen (II)
Elenco: Chiwetel Ejiofor, Michael Fassbender, Benedict Cumberbatch…
Gêneros: Drama; Histórico
Nacionalidade: EUA

Sinopse (Google):
Em 1841, Solomon Northup é um negro livre, que vive em paz ao lado da esposa e filhos. Um dia, após aceitar um trabalho que o leva a outra cidade, ele é sequestrado e acorrentado. Vendido como se fosse um escravo, Solomon precisa superar humilhações físicas e emocionais para sobreviver. Ao longo de doze anos, ele passa por dois senhores, Ford e Edwin Epps, que, cada um à sua maneira, exploram seus serviços.

Avaliação:
IMDb: 8,1
Rotten: 96%
Metacritic: 96%
Filmow (média geral): 4,3
Adoro Cinema (usuários/adorocinema): 4,6/4,5
Kontaminantes (Matheus J. S.): 9
Avaliação

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