23 de novembro de 2018

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Infiltrado na Klan

Pôster


A Ku Klux Klan com certeza é um dos grupos mais inflexíveis e famigerados do mundo. Apesar dos ideais retrógrados e radicais, a organização permanece forte nos dias de hoje, assim como bastante presente em estudos, pesquisas e frequentemente tema a ser esmiuçado nos mais variados meios do entretenimento. Não obstante, o recente trabalho de Spike Lee é o mais novo recurso midiático e audiovisual a centralizar tal pauta.
Infiltrado na Klan é um filme de discurso escrachado, impudico quanto ao que deseja transmitir. Utilizando o absurdo, a ironia e a sátira como primordiais ferramentas narrativas, o longa retrata um período de efervescência social que serviu para moldar uma sociedade segregada; não se engane, apesar das principais críticas aqui estarem voltadas ao racismo contra os negros, há também uma importante discussão que remete a discriminação de judeus e a sociedade em si como um grande núcleo polarizado onde o ódio prevalece em cada esquina. Sobretudo, o sarcasmo somente é um atributo diegético funcional por conta da veracidade dos eventos representados, o que torna tudo ainda mais impressionante, jocoso (embora de modo politicamente incorreto) e impactante.
Contudo, algumas licenças criativas do roteiro, que se aproveitam da insanidade dos fatos, se mostram demasiado discrepantes na confecção de exageros. Isto é, determinados personagens, apesar de propositalmente execráveis, recebem maior tempo em cena que o necessário, e certos diálogos entre o Flip e o Felix são patéticos e falhos ao tentar conceber algo engraçado. Além, há algumas sequências que, de tão ridículas, ilógicas e insignificantes, acabam por ser nada mais que passagens toscas e impertinentes (um segmento que reflete muito bem isto, é quando o protagonista, de maneira repentina e totalmente despropositada, gesticula várias vezes sozinho como se estivesse aplicando golpes marciais).
Em contraparte, as cenas de maior eficácia cômica são aquelas nas quais Ron e Flip fingem ser o que não são, ou seja, verbalizam uma série de insultos que atacam diretamente a si mesmos. O próprio personagem interpretado pelo Michael Buscemi é hilário, este que, apesar de carismático e com bom tempo inicial em tela, logo é simplesmente deixado de lado; uma maior participação deste teria sido bem-vinda e profícua.
A direção do Spike Lee é simples, concisa e segura, com pouquíssimas empreitadas engenhosas que fujam de um comando convencional. A concepção dos personagens é superficial, nenhum possui algum tipo de embasamento individual aprofundado, e a imagem da Patrice, embora sirva como intermediária do público com o movimento negro protestante, é dispensável fora isto. Entretanto, alguns caminhos usados pelo roteiro se mostram cirúrgicos, principalmente aqueles referentes à própria Ku Klux Klan.
Em outras palavras, a forma com que a milícia é retratada não se restringe a macacões brancos e grotescos capuzes, a película procura dar um rosto ao mal que vai além da perspectiva genérica que as pessoas geralmente têm do grupo. Igualmente vale ressaltar que Infiltrado na Klan não é uma produção graficamente violenta, mas sim uma obra que manifesta a hostilidade dos ideais criticados por meio da linguagem ofensiva e desinibida de seus personagens; a repulsa e furor naturais do dia a dia com que muitas personas mencionam os negros na trama, chegam a ser mais chocantes que, por exemplo, um take extremamente sanguinolento.
Ademais das críticas destacadas, o filme tece alfinetadas bastante incisivas e despudoradas à periculosidade da associação entre extremismo, religião, patriotismo, política e autoridade. É neste âmbito que o longa utiliza seus minutos finais para apresentar filmagens reais estarrecedoras dos EUA que mostram conflitos atuais entre negros e brancos e a força que ainda exerce os valores da supremacia ariana em pleno século XXI. Já praticamente como última cena, o diretor faz uma crítica pessoal ao presidente estadunidense Donald Trump, o que é descartável, impulsivo e nada construtivo.
Falando em final, o terceiro ato da película é muito bem projetado, semeando paulatinamente um senso de presságio que antecipa um iminente e sanguinário confronto; aqui o filme está em seu ápice e a dramaticidade em seu apogeu. No mais, o desfecho em si é agridoce, calculado na dose certa para agradar a todos: suficientemente realista para os mais pragmáticos, e suficientemente otimista para os mais sonhadores.
Como adendo, a caracterização dos anos 70 é outro aspecto de realce, seja na constituição da trilha sonora que enfatiza os sucessos da época, assim como no figurino e design de produção que exaltam as tendências e padrões estéticos do período. A obra é feita com o intuito de incomodar o espectador, o que requer um esmero técnico nas respectivas composições ambientais e cenográficas que também salientam o abalo das reflexões proporcionadas visto a verossimilhança e imersão atmosférica.
Em suma, Infiltrado na Klan não é o tipo de filme inesquecível que será debatido daqui a cem anos, mas sim um tipo singular que entretém, inquieta e frustra ao mesmo tempo quem o assiste.
Matheus J. S.

Assista e Kontamine-se

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Ficha Técnica:
Data de lançamento (Brasil): 22 de novembro de 2018
Direção: Spike Lee
Elenco: John David Washington, Adam Driver, Topher Grace…
Gênero: Policial
Nacionalidade: EUA

Sinopse (Google):
Em 1978, Ron Stallworth, um policial negro do Colorado, conseguiu se infiltrar na Ku Klux Klan local. Ele se comunicava com os outros membros do grupo por meio de telefonemas e cartas, quando precisava estar fisicamente presente enviava um outro policial branco no seu lugar. Depois de meses de investigação, Ron se tornou o líder da seita, sendo responsável por sabotar uma série de linchamentos e outros crimes de ódio orquestrados pelos racistas.

Avaliação:
IMDb: 7,6
Rotten: 95%
Metacritic: 83%
Filmow (média geral): 4,3
Adoro Cinema (usuários/adorocinema): 3,7/4,0
Kontaminantes (Matheus J. S.): 7
Avaliação

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