9 de novembro de 2018

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Mudbound

Pôster


Dentre os filmes que passaram a agregar o catálogo da Netflix no Brasil em 2018, provavelmente nenhum foi tão notório e exímio quanto Mudbound. Com quatro indicações ao Oscar, elenco de peso e uma estória mordaz a contar, Mudbound é uma experiência imprescindível a todo cinéfilo.
Mudbound é uma produção de enredo cru, seco e brusco que não possui restrições quanto ao que mostrar e explorar, e por isto é tão verossímil, rico em conteúdo e imprevisível. Ao abranger o convívio no campo de duas famílias, uma negra e outra branca, o longa compila e destrincha uma série de temas socialmente relevantes. Contanto, tudo isso só é possível conforme a utilização de um período histórico plausível para a inserção e desenvolvimento orgânico de tais contextos. Estes, desenvoltos durante os anos 40, transitam pelo apogeu da Segunda Guerra Mundial, distinção de classes sociais e etnias, laboriosa vida no campo, racismo, figura matriarcal e social da mulher, alcoolismo etc. Ok, mas como é que esta miscigenação de textos pode ser devidamente abordada sem atropelamentos ou saturações?
Ademais do enxerto historicamente adequado que propicia os respectivos estudos, estes se entrelaçam idiossincraticamente as figuras centrais da trama, seja Laura amargurada em uma relação na qual não tem voz ativa, Henry desiludido com a vida que sonhava, Pappy McAllan permeado por seus ideais culturais de superioridade étnica, Hap ocupando o posto de líder da família e lidando com as mudanças ocasionadas pela chegada dos McAllan, Florence tendo de enfrentar as dificuldades para cuidar dos próprios filhos e atender às demandas dos vizinhos, e Jamie e Ronsel progredindo com seus assombros da guerra.
O racismo, da maneira vista na película, é bastante contundente, já que é um elemento que engloba praticamente todas vertentes do entrecho e representa com consentaneidade a enraizada segregação racial do Mississippi que reverbera até os dias de hoje. É neste âmbito, com intuito de refletir a crueldade desta ótica polarizada, que se originam as sequências mais chocantes da obra, sobretudo totalmente críveis e genuínas. E é também neste viés que surgem os dois melhores personagens do filme, Ronsel e Jamie que, muito além das disparidades ideológicas e raciais, encontram subterfúgio em uma amizade improvável alicerçada no passado traumático em comum. A relação se constrói de forma humana e contagiante, moldada por diálogos fluidos onde se articula um belo exercício de personalidades enfaticamente opostas que veem nas semelhanças motivos para superarem todas as divergências e angústias pessoais.
Como estratégia para harmonizar a disposição de enfoques individuais que frisa a ausência dum protagonista, praticamente todo personagem recebe um tempo significativo em cena (uns mais que outros, no entanto), onde, como método para intensificar a relação do público com a persona, frequentemente se usa o recurso do voice over para exprimir suas perspectivas. Embora possa parecer ser um artifício empregado com intuito de facilitar a narrativa, aqui este é inoculado com o objetivo de transparecer o que não é exposto em tela consoante a falta de espaço. Ademais, apesar de, em determinados momentos, o roteiro aparentar estar concedendo demasiado realce a situações supostamente frívolas ou, em contraparte, pouquíssima dedicatória a um específico evento, toda e qualquer circunstância apresentada é minuciosamente planejada e, ainda que não de modo direto, está inerentemente vinculada ao núcleo de maior expansão. Isto é, tudo em Mudbound está engajado em uma enorme esfera de acontecimentos pertinentes um ao outro.
A caracterização dos cenários é um deleite a parte. Priorizando uma fotografia lamacenta com destaque para tons amarronzados e cinzentos delineados por constantes chuvas, a paleta de cores, ao passo que tão bela, igualmente retrata os empecilhos e potenciais contratempos ao se sujeitar viver naquelas terras úmidas e inclementes. A trilha sonora, composta por Tamar-kali, dita com suntuosidade a cadência do longa, enquanto as atuações, por si só, são impecáveis. Entretanto, mesmo que tenha sido a Mary J. Blige indicada à estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante, quem realmente atrai os holofotes é Carey Mulligan, simplesmente fascinante no papel de Laura, incorporando com primor toda a versatilidade de emoções da figura interpretada: desesperança; desejos reprimidos; submissão desgostosa ao marido; desespero; amabilidade aos filhos; dor e até racionalidade nos devidos instantes.
Em suma, Mudbound é um filme forte, de ritmo imarcescível e incisivas reflexões que sabe dosar com maestria a atenção cedida a cada um de seus múltiplos personagens.
Matheus J. S.  10

Dentre vários capítulos escuros da história da humanidade, talvez os mais vergonhosos sejam os que envolvam a intolerância racial. O Mississippi foi um dos palcos dessa tragédia e é o cenário desse filme.
Mudbound apresenta uma trama composta de vertentes que se entrelaçam, se completam e expõem certas dificuldades em sobreviver numa época difícil por si só que é agravada ainda mais por uma guerra.
A narrativa por mais de um personagem e fora de ordem cronológica proporciona uma perspectiva singular a cada momento, toda ação por um dos personagens tem uma reação nos outros fazendo com que o interesse do público se mantenha constante.
Contando com personagens fortes, cada qual com o seu drama, suas características e sua importância, é difícil dizer qual se destaca. Os atores estão condizentes com o que se espera. Pessoalmente destaco o trabalho do ator Jonathan Banks, que outrora, em uma série aclamada pelo público e pela crítica, interpretou um personagem ímpar que adquiriu a simpatia de muitos; agora o personagem deste longa consegue causar repulsa. Detalhes como estes mostram a versatilidade e o talento do ator, que consegue se sobressair em diversos campos.
Para quem não teve a oportunidade de ver outras produções similares um pouco antigas, certamente se impressionará com todo o contexto inserido, enquanto alguns que já estão há mais tempo na estrada, reconhecerão mais o valor da perspectiva apresentada.
Mudbound é um filme para ser apreciado calmamente, degustando todos os ingredientes de sua fórmula. Concepção fluente, foco abrangente, aborda questões antigas, porém ainda vivas no século vinte e um.
leonejs.  7,5

Assista e Kontamine-se

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Ficha Técnica:
Data de lançamento (Brasil): 15 de fevereiro de 2018
Direção: Dee Rees
Elenco: Garrett Hedlund, Jason Mitchell, Carey Mulligan…
Gênero: Drama
Nacionalidade: EUA

Sinopse (Google):
Laura se casa com Henry McAllan e sua nova família se muda para uma fazenda no delta do Rio Mississipi. Lá, uma família negra, os Jackson, são responsáveis por ajudar no trabalho pesado com o plantio e a colheita. O pai idoso de Henry, Pappy McAllan, luta para manter os privilégios dos brancos no terreno, enquanto o irmão de Henry, Jamie, desenvolve uma boa amizade com os caseiros por compartilharem traumas da guerra. Um violento conflito marca a convivência entre os McAllan e os Jackson.

Avaliação:
IMDb: 7,4
Rotten: 97%
Metacritic: 85%
Filmow (média geral): 4,1
Adoro Cinema (usuários/adorocinema): 4,1/3,5
Kontaminantes (média): 8,5
Avaliação

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