30 de outubro de 2019

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Vidro

Pôster


Mais que o novo filme de M. Night Shyamalan, Vidro completa uma trilogia que conta com dois excelentes capítulos: Corpo Fechado e Fragmentado. Incumbido de encerrá-la à altura, será que o mais recente trabalho do cineasta indiano cumpre com suas obrigações?
Sem delongas, Vidro falha em sua missão. Apesar de algumas boas ideias, o longa demonstra irregularidades majoritariamente vinculadas ao ritmo enfadonho e a concepção mal-ajambrada de personagens e arcos adjacentes. Isto é, ao manter confinados seus protagonistas durante grande parte do enredo, a película adquire um cadenciamento maçante que desperdiça as melhores faculdades de seus astros enquanto introduz subtramas pífias sem qualquer tipo de desenvolvimento. Casey passa o filme todo dispersa ao núcleo central saturando o texto em tentativas falhas deste romantizar sua relação com Kevin; é algo que não há explicação ou sequer ganhe camadas. Já Joseph em instante algum justifica sua participação no longa, assim como a mãe de Elijah que é regurgitada na trama; ambos existem para reciclar papeis de dezenove anos atrás como forma da produção se mostrar mais atrativa do que realmente é. Vale ressaltar uma cena pretensiosamente tocante na qual os três últimos citados dão as mãos e se emocionam por um determinado motivo; é tosco, clichê e não faz sentido, até porque o espectador jamais consegue se envolver sentimentalmente com os mesmos.
A Dra. Ellie é outro desastre. Insossa e desinteressante, a personagem é a responsável pela exposição preguiçosa de alguns pontos-chave do script e por fastidiosas repetições acerca de sua tese sobre as figuras centrais; é exaustivo, além do texto claramente subestimar seu público. Entretanto, essa mesma persona é a encarregada de ser um fio condutor bastante engenhoso do roteiro.
Desastrosa também é a utilização de flashbacks. Frívolo em sua maioria, o recurso, da maneira mais obvia possível, procura reiterar alguns elementos que já foram verbalmente enfatizados, o que torna a película redundante e pouco entusiástica. Neste âmbito, o assistente é convidado a desbravar pouco mais do passado de Kevin, porém sem o aprofundamento devido e, novamente, de modo patente. Outros artifícios usados, tais como alongados planos-sequência, primeiríssimos plano, inversos jogos de câmera e paleta de cores onírica e cartunesca, não exercem efeito, visto que a falta de inspiração do roteiro inibe o potencial de todas as outras vertentes da obra, quaisquer sejam suas intenções.
As sequências antagônicas entre Kevin e David que deveriam ser o auge recreativo do longa são, a grosso modo, "brochantes". Minimalistas e frustrantes (há apenas dois segmentos em que os personagens se confrontam ao longo de todo o filme), as respectivas não acompanham a trilha atmosférica que deveria ditá-las, não possuem a verossimilhança necessária para emular uma luta de verdade, e muito menos a extravagância requerida por um embate fictício de grandes proporções. Isto se deve ao uso excessivo de planos faciais e da câmera subjetiva que nunca permitem o espectador ter um panorama limpo e completo do que se passa, ademais da coreografia ser - na ausência de um termo melhor - bisonha.
Na contramão de tudo até então mencionado, está Elijah. Último dos três protagonistas a dar as caras (o que eleva as expectativas em torno de sua aparição), o personagem mantém a filosofia prezada em Corpo Fechado e é o motriz de algumas guinadas cabais do roteiro. Mais que um singelo vilão ou herói unidimensional, Elijah é o arquiteto de um esquema arrojado que se entrelaça as principais reflexões do entrecho, como: autoaceitação, fé e o que é ser um super-herói. Embora sua genialidade seja bem explorada, o Sr. Vidro se vê refém da autoindulgência da película que, em menos de quinze minutos, articula três plot twists determinantes para o arco do mesmo e de seus companheiros de tela. Tais reviravoltas denotam eficácia somente para alguns, ou seja, estas dependem exclusivamente das expectações do assistente e a receptividade deste para com o absurdo.
Concernente as atuações, James McAvoy indubitavelmente se destaca. Mais uma vez perfeito na maleabilidade com que interpreta múltiplas personalidades, o ator, além das facetas antes incorporadas, tem a oportunidade de viver, mesmo que brevemente, personas inusitadas da mente de Kevin, o que ratifica seu talento e versatilidade. Seja nos trejeitos, maneirismos, feições, forma de andar, se portar, entonação da voz, McAvoy veste cada identidade com primor e deslumbre: Kevin é o mais conflituoso e instável da Horda; Hedwig o mais pueril e inócuo; Patricia a mais perspicaz, fria e inteligente; e a Fera (ou Besta) a mais amedrontante, de imponente e intimidante presença física, totalmente visceral e selvagem. Ademais, Hedwig é a veia cômica instrumental e coesa do longa, assim como a abrupta mudança de personalidades de Kevin em específicos momentos que, considerando a discrepância de algumas de suas identidades, resulta num hilário contraste.
No que se refere ao restante do elenco, Samuel L. Jackson está bastante confortável em seu papel: sagaz e audacioso. Bruce Willis, em contraparte, não apresenta vigor, ele simplesmente atua e não demonstra preocupação em se entregar genuinamente ao projeto; é uma performance comum e indolente. Anya Taylor-Joy, por sua vez, tem um desempenho consentâneo ao texto que lhe é dado (o que não é muita coisa), em outras palavras, a atriz fica com “cara de choro” o filme inteiro.
No mais, Vidro, apesar de unir criativamente dois universos fabulosos de Shyamalan, não funciona individualmente: é arrastado, problemático, dissonante e desleixado.
Matheus J. S.

Assista e Kontamine-se

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Ficha Técnica:
Data de lançamento (Brasil) 17 de janeiro de 2019
Direção: M. Night Shyamalan
Elenco: James McAvoy, Bruce Willis, Samuel L. Jackson…
Gênero: Suspense
Nacionalidade: EUA

Sinopse (Google):
Kevin Crumb, um homem com 24 personalidades diferentes, passa a ser perseguido por David Dunn. O jogo de gato e rato entre o homem inquebrável e a Fera é influenciado pela presença de Elijah Price, que manipula seus encontros e guarda segredos sobre os dois.

Avaliação:
IMDb: 6,7
Rotten: 37%
Metacritic: 43%
Filmow (média geral): 3,5
Adoro Cinema (usuários/adorocinema): 4,0/4,5
Kontaminantes (Matheus J. S.): 4
Avaliação

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