Com a recente estreia do superestimado Parasita nos cinemas brasileiros, os cinéfilos do país, inebriados com o longa de Bong Joon-ho,  parecem ter se abdicado completamente do mundo exterior. Em face disso, decorre o fato que muitos filmes autenticamente bons passem despercebidos pelo respectivo público, o que, infelizmente, aconteceu com The Farewell.

A primeira frase a aparecer no visor, diz muito sobre a obra: "Baseado numa verdadeira mentira". Considerando que a trama é inspirada nas experiências pessoais da própria diretora (Lulu Wang), a película esbanja um tato bastante apurado ao sintonizar distintos tons que só poderia ser fruto da delicadeza de alguém que realmente vivenciou tais acontecimentos. Em consequência, uma ironia narrativa - corroborando a frase acima - ganha ênfase salientando a predileção do script em atenuar o ar soturno que o permeia, objetivando, dessa forma, tornar o texto mais palatável e fornecer uma perspectiva otimizada das circunstâncias vigentes. Dito isso, a ironia supracitada articula-se também sobre o molde idiossincrático dos personagens, afetando-lhes, por conseguinte, o comportamento dissimulado frente à desconfortável situação que enfrentam e como eles reagem a esta.

Nesse sentido, The Farewell é uma produção que transborda sentimentos. Catapultados pelo mar de emoções que os reencontros familiares despertam, estes são arraigados em ressentimentos e culpa, concebendo uma estória que fala sobre laços, rupturas, afeto, morte, tempo, distância e reconexão. Impostas tais pautas, o filme abre espaço para os personagens se realçarem, visto que a interação orgânica entre os mesmos forma a argamassa responsável por sustentar o enredo, este que possui como expoente o cativante vínculo que une avó e neta. No que concerne a esse âmbito, o único pecado do longa centra-se no equilíbrio de tempo desbalanceado com que as diferentes figuras residem em tela.

Por sua vez, a direção é simplista e pragmática, salvo alguns trechos em slow motion que são, à sua maneira, bem estilosos. A utilização de cortes secos confere um tom cru ao entrecho, e a trilha extradiegética, majoritariamente minimalista, compõe-se de melindrosos toques de piano e uma ou outra música oralmente cantada. Toda essa modéstia estrutural reitera a confecção de parâmetros para que os personagens se destaquem, seja através do carisma que cada um tem a oferecer, seja por intermédio da execução de conversações que, ademais de muito bem escritas, enaltecem a fluida dinâmica do elenco. Individualmente, convém exaltar a Nai Nai, persona simpática e contagiante detentora de uma inocência quase pueril; o assistente, assim como os personagens, sente o peso de sua iminente morte, o que é acentuado mediante a ignorância dela com relação ao próprio destino.

Outrossim, a película tem sua força motriz calcada nos dilemas morais propostos pelo contexto que imbui a mesma. Em outras palavras, The Farewell demonstra proficiência ao criar situações que constantemente fazem os personagens se indagar sobre o que é certo e errado, impondo-lhes questionamentos acerca da procedência ética que a omissão conjunta do diagnóstico de Nai Nai provoca. Essa vertente do roteiro igualmente engaja o espectador em um embate de tradições culturais, fornecendo, além de um exercício de tolerância, a perspectiva inusitada de um povo que habita o outro lado do mundo e discerne os problemas de um modo ímpar.

Por fim, o filme ainda encontra espaço para incutir mensagens que remetem a raízes e pertencimento, o que, consoante a parcimônia dos atores em tela, projeta-se também na escolha de um elenco fidedigno à etnia representada, visto que todos os cineastas são realmente chineses ou de ascendência asiática.

Em suma, The Farewell é uma obra bela, sensível e contagiante que tem muito mais a dizer do que simplesmente aparenta.

Matheus J. S.

Assista e Kontamine-se

Comente, Compartilhe e Siga Nosso Blog

Ficha Técnica:

Data de lançamento (Canadá): 19 de julho de 2019

Direção: Lulu Wang

Elenco: Awkwafina, Tzi Ma, Jim Liu…

Gênero: Drama

Nacionalidades: EUA e China

Sinopse (Adoro Cinema):

Quando a família de uma doce senhora descobre que ela possui apenas mais algumas semanas de vida, eles decidem não informá-la a respeito do diagnóstico. Em vez disso, seus filhos e netos tentam arranjar um casamento de última hora para que todos os parentes mais distantes possam vê-la por uma última vez sem que ninguém saiba o que está acontecendo de verdade.

Avaliação:

IMDb: 7,8

Rotten: 99%

Metacritic: 89%

Filmow (média geral): 4,1

Kontaminantes (Matheus J. S.): 9,5

The Farewell

Com a recente estreia do superestimado Parasita nos cinemas brasileiros, os cinéfilos do país, inebriados com o longa de Bong Joon-ho,  parecem ter se abdicado completamente do mundo exterior. Em face disso, decorre o fato que muitos filmes autenticamente bons passem despercebidos pelo respectivo público, o que, infelizmente, aconteceu com The Farewell.

A primeira frase a aparecer no visor, diz muito sobre a obra: "Baseado numa verdadeira mentira". Considerando que a trama é inspirada nas experiências pessoais da própria diretora (Lulu Wang), a película esbanja um tato bastante apurado ao sintonizar distintos tons que só poderia ser fruto da delicadeza de alguém que realmente vivenciou tais acontecimentos. Em consequência, uma ironia narrativa - corroborando a frase acima - ganha ênfase salientando a predileção do script em atenuar o ar soturno que o permeia, objetivando, dessa forma, tornar o texto mais palatável e fornecer uma perspectiva otimizada das circunstâncias vigentes. Dito isso, a ironia supracitada articula-se também sobre o molde idiossincrático dos personagens, afetando-lhes, por conseguinte, o comportamento dissimulado frente à desconfortável situação que enfrentam e como eles reagem a esta.

Nesse sentido, The Farewell é uma produção que transborda sentimentos. Catapultados pelo mar de emoções que os reencontros familiares despertam, estes são arraigados em ressentimentos e culpa, concebendo uma estória que fala sobre laços, rupturas, afeto, morte, tempo, distância e reconexão. Impostas tais pautas, o filme abre espaço para os personagens se realçarem, visto que a interação orgânica entre os mesmos forma a argamassa responsável por sustentar o enredo, este que possui como expoente o cativante vínculo que une avó e neta. No que concerne a esse âmbito, o único pecado do longa centra-se no equilíbrio de tempo desbalanceado com que as diferentes figuras residem em tela.

Por sua vez, a direção é simplista e pragmática, salvo alguns trechos em slow motion que são, à sua maneira, bem estilosos. A utilização de cortes secos confere um tom cru ao entrecho, e a trilha extradiegética, majoritariamente minimalista, compõe-se de melindrosos toques de piano e uma ou outra música oralmente cantada. Toda essa modéstia estrutural reitera a confecção de parâmetros para que os personagens se destaquem, seja através do carisma que cada um tem a oferecer, seja por intermédio da execução de conversações que, ademais de muito bem escritas, enaltecem a fluida dinâmica do elenco. Individualmente, convém exaltar a Nai Nai, persona simpática e contagiante detentora de uma inocência quase pueril; o assistente, assim como os personagens, sente o peso de sua iminente morte, o que é acentuado mediante a ignorância dela com relação ao próprio destino.

Outrossim, a película tem sua força motriz calcada nos dilemas morais propostos pelo contexto que imbui a mesma. Em outras palavras, The Farewell demonstra proficiência ao criar situações que constantemente fazem os personagens se indagar sobre o que é certo e errado, impondo-lhes questionamentos acerca da procedência ética que a omissão conjunta do diagnóstico de Nai Nai provoca. Essa vertente do roteiro igualmente engaja o espectador em um embate de tradições culturais, fornecendo, além de um exercício de tolerância, a perspectiva inusitada de um povo que habita o outro lado do mundo e discerne os problemas de um modo ímpar.

Por fim, o filme ainda encontra espaço para incutir mensagens que remetem a raízes e pertencimento, o que, consoante a parcimônia dos atores em tela, projeta-se também na escolha de um elenco fidedigno à etnia representada, visto que todos os cineastas são realmente chineses ou de ascendência asiática.

Em suma, The Farewell é uma obra bela, sensível e contagiante que tem muito mais a dizer do que simplesmente aparenta.

Matheus J. S.

Assista e Kontamine-se

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Ficha Técnica:

Data de lançamento (Canadá): 19 de julho de 2019

Direção: Lulu Wang

Elenco: Awkwafina, Tzi Ma, Jim Liu…

Gênero: Drama

Nacionalidades: EUA e China

Sinopse (Adoro Cinema):

Quando a família de uma doce senhora descobre que ela possui apenas mais algumas semanas de vida, eles decidem não informá-la a respeito do diagnóstico. Em vez disso, seus filhos e netos tentam arranjar um casamento de última hora para que todos os parentes mais distantes possam vê-la por uma última vez sem que ninguém saiba o que está acontecendo de verdade.

Avaliação:

IMDb: 7,8

Rotten: 99%

Metacritic: 89%

Filmow (média geral): 4,1

Kontaminantes (Matheus J. S.): 9,5