Ainda que Hollywood não tenha obtido êxito com
uma de suas maiores apostas no ramo das cinebiografias em 2018, Bohemian Rhapsody, o sucesso de público e o fabuloso trabalho de marketing
realizado pelo mesmo, aparentemente são fatores suficientes para fazer com que
os estúdios se sintam confiantes para seguir investindo no gênero. Nessa empreitada,
a Paramount decide-se arriscar com Rocketman, produção biográfica comprometida
a abordar as vicissitudes da carreira de Elton John.
Com a afirmação do próprio cantor de que não
gostaria de ver a película amenizando a parte mais lôbrega de sua vida, o filme
destrincha sob todas as nuances os altos e baixos de sua trajetória. Acima de
tudo, Rocketman é uma obra engajada em humanizar um ícone rockstar, aproximando-o do espectador consoante a exposição de seus
problemas, dilemas e imperfeições. Isso se dá desde o primeiro instante com o
roteiro estabelecendo os conflitos familiares do artista, tanto através do
distanciamento com o pai, quanto por intermédio dos atritos que revestem a
relação com a mãe; é interessante observar como essas mágoas ressoam em sua vida
adulta, o que atribui camadas ao texto e salienta a percepção de causa e
consequência.
O vício em álcool e drogas também não passa
batido, assim como a abordagem de sua homossexualidade que se articula como
pretexto para o retrato crítico de uma época onde a classe LGBT era repudiada e
tinha de viver sob a perdição de ter seus impulsos sexuais reprimidos e
condenados; embora faça parte da história do astro, o longa não se esforça para
incrementar a pauta com algo novo que o assistente antes já não tenha visto. Ademais,
o conturbado relacionamento de Elton com o empresário John igualmente ganha
destaque. Se, por um lado, a relação deles serve como gatilho para determinadas
atitudes do protagonista, por outro há pouco tempo para um desenvolvimento
adequado desse vínculo, atenuando, em decorrência, o impacto que os efeitos deste
deveriam exercer no cotidiano de Elton; falta substância, o que faz parecer que
o enredo supervaloriza um elemento que não possui material suficiente para ser trabalhado.
Para o contar de sua estória, Rocketman recorre
a uma narrativa em voice over do próprio Elton, permitindo o mesmo aparar
e depurar os principais pontos de seu percurso. Não obstante, um dos grandes
trunfos da película concentra-se na estrutura típica de um musical, criando
imediatamente um senso de imersão calcado no clima entusiástico proporcionado
pelas músicas do cantor. A inserção destas jamais tornam-se inconvenientes,
afinal, elas são o cerne do filme, além de muito bem cantadas, coreografadas,
dirigidas e empregadas organicamente à argamassa que molda o entrecho.
Nesse sentido, o diretor (Dexter Fletcher) conduz
as cenas com assaz destreza, demonstrando um consciente controle de espaço e
uma imaginação fértil ao casar as respectivas com aspectos fantasiosos constituintes
de sequências quiméricas que, ao passo que dão um ar lúdico ao longa, não
desrespeitam as matizes mais densas do texto. Outrossim, a cadência tonal da
obra é notável, transitando com fluidez da mais pura harmonia à mais lúgubre face
da vida de um homem que se afogou gradualmente em um mar de aflição proveniente
das próprias escolhas. Fletcher esbanja essa mesma habilidade também em escala
menor, indo do trabalhoso processo criativo de confeccionar melodias e a
ansiedade que precede uma apresentação, até a euforia que permeia a performance
frente ao público. Além do mais, apesar da aptidão do cineasta em criar cenas
individualmente marcantes, há um trecho próximo ao fim que se enquadra quase
como um manual lisérgico de autoajuda; é simplesmente burlesco e descartável.
Sob a pele de Elton John, está Taron Egerton. Além
do figurino, da cinematografia e do design de produção que remetem em
todos os sentidos aos anos em que o músico viveu o seu auge, a caracterização do
ator em si é extremamente similar às peculiaridades que o cantor costumava
ostentar em seus shows. No entanto, mais do que apenas usar uma roupa
semelhante, Taron convence como um aspirante do rock versado apaixonado pela música,
com desenvoltura em palco, uma dicção muito boa e uma extravagância visual que,
reiterando, dialoga perfeitamente com a personalidade ímpar da figura
interpretada. Ademais, o ator incorpora com autenticidade todas as angústias do
personagem, bem como os episódios mais carregados de seu trajeto, ao mesmo
tempo em que se vê obrigado a vestir uma máscara para ser aceito e admirado. Não
se pode deixar de mencionar a química do ator com Jamie Bell (amigo de Elton na
trama), esta, que apesar de formidável, é preterida a partir do segundo ato
para um aprofundamento necessário do próprio arco do cantor.
Em suma, Rocketman é um filme fiel e de ritmo
pulsante que leva o espectador a uma jornada de familiarização com um dos maiores
ícones rockstars da atualidade.
Matheus J. S.
Assista e Kontamine-se
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Ficha Técnica:
Data de lançamento (Brasil): 30
de maio de 2019
Direção: Dexter Fletcher
Elenco: Taron Egerton, Jamie Bell, Richard Madden…
Gênero: Drama
Nacionalidade: Reino Unido
Sinopse (Google):
Extremamente
talentoso mas muito tímido, o pianista prodígio Reginald Dwight muda seu nome
para Elton John e torna-se uma estrela da música de renome internacional
durante os anos 1970.
Avaliação:
IMDb: 7,4
Rotten:
89%
Metacritic:
69%
Filmow
(média geral): 4,0
Adoro
Cinema (usuários/adorocinema): 4,1/3,5
Kontaminantes
(Matheus J. S.): 7,5
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