Filmes biográficos fazem parte de um gênero que
se prolifera aos montes nos entremeios da indústria cinematográfica. Dentre os
títulos de destaque da atual temporada de premiações (como Dois Papas e Meu Nome é Dolemite), Ford vs. Ferrari com certeza é um dos que mais ganha realce. Entretanto,
será que o alarde possui embasamento?
De antemão, é impossível discorrer sobre Ford vs.
Ferrari é não mencionar as corridas. Limpas, inteligíveis e entusiásticas, as cenas
não se limitam a um ângulo ou uma perspectiva única, alternando-se entre vários
tipos de plano: aberto, fechado, frontal, traseiro e plano-detalhe, ou focando
exclusivamente nas expressões faciais do piloto mediante a efervescência de
emoções desperta pela adrenalina da pilotagem. Posto isto, os aspectos técnicos
se acentuam, sejam os efeitos práticos que atribuem realidade aos segmentos, a
trilha que eleva a atmosfera em vigência e a mixagem de som que fornece vigor a
potência dos automóveis.
Remetente ao desafio final, as 24 Horas de Le
Mans - evento que preenche grande parcela do terceiro ato - é o grande apogeu do
longa. Usufruindo de adventos que constantemente fazem e direção se reinventar
e não permitem que a película jamais se torne maçante, James Mangold (diretor) conduz
a competição com primor, canalizando a atenção do público em uma diversidade de
acontecimentos sobre uma mesma e axiomática circunstância: vencer a corrida. Nesse
sentido, o cineasta usa fatores climáticos, elementos de risco e eventuais
incidentes para confecção de uma acirrada, tensa e emocionante disputa; ainda
que o espectador saiba o que irá acontecer, o roteiro o faz se questionar como,
brincando com os sentimentos do mesmo e surpreendendo-o diante das peripécias
que permeiam o processo de realização.
Sobretudo, Ford vs. Ferrari é mais que um
filme sobre corridas - é sobre dois homens apaixonados por carros em confronto com
uma corporativa multibilionária para alcançar seus sonhos. Nesse sentido, as
ocorrências se efetuam sem pressa, explorando os detalhes burocráticos, o aprimoramento dos carros e o treinamento de Ken, o que, ao fim, atribui muito
mais peso a jornada dos personagens. Contudo, individualmente falando, o arco
de Carroll Shelby, apesar da importância e das boas cenas que este agrega, não
é condensado pelo enredo, desperdiçando um enorme potencial pincelado desde o
trecho de abertura.
Outrossim, a motivação que desencadeia o
desenrolar da trama é pífia, mas convincente dentro dos parâmetros estabelecidos
pela narrativa e a concepção idiossincrática das personas. Dito isso, os rostos
periféricos são operantes e profícuos no que concerne ao tempo de tela disponibilizado
a cada um. A única exceção diz respeito a Leo Beebe, que faz o genérico e
"malvadão" executivo. Ademais, o script
demonstra similar insensibilidade na forma caricata com que retrata os
italianos; é raso e desnecessário.
Não obstante, Christian Bale merece muito do
mérito até então grifado. O ator interpreta um homem difícil, soberbo e até
insolente, dono de uma performance calcada nos maneirismos do personagem, modo
de falar, agir e se portar. Além, Bale ludibria a todos como um exímio mecânico
e piloto, chegando a conquistar a simpatia do assistente, se não pelo forte caráter,
pela dedicação e vontade. Por sua vez, Matt Damon tem uma atuação comum ao
correr do longa, com ressalva à cena final; (SPOILERS A
SEGUIR) esta, ademais de fortificar a relação entre Carroll e Ken, traz
o melhor momento de Damon, arrebatando o público com sua dor e pesar pela morte
do amigo.
No mais, o filme estende-se pouco mais que o devido,
articulando o acidente de Ken mais como obrigação biográfica do que por
necessidade narrativa. (FIM DOS SPOILERS) Entretanto,
Mangold presenteia o espectador com um desfecho soturno sem se permitir liberdades
criativas para fantasiar fatos amargos, moldando um entorpecente e indigesto
clímax respaldado na lugubridade da vida. Vale ressaltar que essa melancolia
derradeira é contrabalanceada pelo entrecho com pontuais e eficazes pitadas
cômicas.
Em suma, Ford vs. Ferrari é um filme intenso,
competente, ajambrado e que se propõe a mais do que meramente entreter
usando carros velozes.
Matheus J. S.
Assista e Kontamine-se
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Ficha Técnica:
Data de lançamento (Brasil): 14
de novembro de 2019
Direção: James Mangold
Elenco: Matt Damon, Christian
Bale, Caitriona Balfe…
Gênero: Drama
Nacionalidade: EUA
Sinopse (Adoro Cinema):
Durante a década de 1960, a Ford resolve entrar
no ramo das corridas automobilísticas de forma que a empresa ganhe o prestígio
e o glamour da concorrente Ferrari, campeoníssima em várias corridas. Para
tanto, contrata o ex-piloto Carroll Shelby (Matt Damon) para chefiar a
empreitada. Por mais que tenha carta branca para montar sua equipe, incluindo o
piloto e engenheiro Ken Miles (Christian Bale), Shelby enfrenta problemas com a
diretoria da Ford, especialmente pela mentalidade mais voltada para os negócios
e a imagem da empresa do que propriamente em relação ao aspecto esportivo.
Avaliação:
IMDb: 8,3
Rotten:
92%
Metacritic:
81%
Filmow
(média geral): 4,0
Adoro
Cinema (usuários/adorocinema): 3,9/4,0
Kontaminantes
(Matheus J. S.): 8,5
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