Pode-se dizer que A Bruxa é, até então, um dos
filmes que mais dividiu o público durante a década. Mais do que isso, a obra de
Robert Eggers foi uma das responsáveis por inaugurar o que vem sendo chamado de
Pós-Terror, uma espécie de subgênero que preza primordialmente o
desenvolvimento psicológico de seus personagens e foge de convenções de gênero
para amedrontar o espectador. Quatro anos mais tarde, o cineasta volta aos
holofotes com O Farol, nova produção que vem gerando tanto estardalhaço quanto.
Reiterando o que foi dito, O Farol não é um
longa que se apropria de artifícios comuns para estimular apreensão no
assistente. Posto isto, a película faz praticamente uma reinvenção do jumpscare, usando o som estridente de
determinados objetos repentinamente inoculados após um corte, para fazer com
que o público tenha um sobressalto. É eficiente, haja visto que o espanto
provém da introdução de ferramentas habituais ao dia a dia, ao mesmo tempo que
personifica sobre a ilha a imagem de um ser vivo e monstruoso.
Nesse sentido, o filme caracteriza-se pela
poderosa utilização do som. A edição e a mixagem deste sublinham o furor das
ondas e da intempérie, ao passo que a trilha é marcada por uma espécie de sinal
ou alarme constante extremamente tétrico. Corroborando, a cenografia cria um ambiente
completamente desconvidativo, bruto, apartado e solitário, pontuado por um
terreno lamacento e a demanda por muito trabalho. Destarte, o local, além de misterioso
por si só, tem a aura frisada mediante a fotografia em preto e branco que enaltece
a atmosfera lúgubre, enquanto a iluminação oscilante delineia a ilha e os
personagens sob contornos fantasmagóricos.
Outro item a realçar-se em O Farol, é o aspecto
anacrônico. A escolha pelo formato em 35 mm e a cinematografia supracitada são adereços
visuais que individualmente já conferem ao longa uma aparência lírica. No
entanto, o quê poético é enfatizado perante os monólogos de Thomas Wake (Willem
Dafoe) que, ademais de muito bem encenados, carregam consigo um tom erudito; é
curioso, singular e pitoresco. Curioso também são as histórias contadas por
este e suas superstições, considerando que elas fomentam o clima labiríntico e
deixam o espectador ainda mais embasbacado.
Não obstante, tratando-se da nova obra de
Robert Eggers, o assistente jamais tem convicções quanto ao enredo. Ao beber de
influências lovecraftianas e recorrer ao uso de elementos oníricos e quiméricos,
o diretor mistura fantasia e realidade em uma epopéia fílmica sobre o homem e seus
limites, para pautar temas como isolamento, abstinência sexual e os efeitos
psicocomportamentais que uma rotina exaustiva e monótona pode afligir sobre o
ser humano. (SPOILERS A SEGUIR) Entretanto, para
se compreender efetivamente as principais alegorias da película, é necessário
que o público possua um prévio conhecimento do mito de Prometeu, o que é
orquestrado sem quaisquer diretrizes pelo roteiro, empobrecendo, consequentemente,
a experiência de espectadores leigos, sem que estes tenham culpa. (FIM DOS SPOILERS)
Centrando isso tudo, estão Thomas Wake e
Ephraim Winslow, dupla que convive sob tensão e violência. Todavia, esta é mais
uma camada que o texto lida com melindre e estranheza, embasando tal agressividade
por meio de falas, gestos e comportamento. Dito isso, a comicidade do longa é
surtida do tolhimento de certas cenas, articulando-se de maneira exótica e
bastante subjetiva.
Sobretudo, esta é uma produção calcada no
talento de seu elenco, que, no caso, resume-se a dois nomes. Willem Dafoe vive
com aptidão um indivíduo de modos rústicos, rabugento, inflexível e grosseiro,
enquanto Robert Pattinson incorpora um
homem mais contido, que adere a uma crescente paranoia e a maleabilidade de
emoções exigida pelas sucessivas circunstâncias insólitas que vem a se deparar;
é igualmente uma atuação de muita fisicalidade endereçada aos desígnios que sua
persona encontra-se atribuída na ilha.
Em suma, O Farol é um filme ímpar, estrambótico
e interpretativo, mas estiloso o suficiente para conquistar até aqueles que se
sintam mais inseguros para dizer que não entenderam algo do que acabaram de
assistir.
Matheus J. S.
Assista e Kontamine-se
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Ficha Técnica:
Data de lançamento (Brasil): 2 de
janeiro de 2020
Direção: Robert Eggers
Elenco: Robert Pattinson, Willem
Dafoe…
Gênero: Terror
Nacionalidades: EUA e Canadá
Sinopse (Google):
Início do século XX. Thomas Wake (Willem
Dafoe), responsável pelo farol de uma ilha isolada, contrata o jovem Ephraim
Winslow (Robert Pattinson) para substituir o ajudante anterior e colaborar nas
tarefas diárias. No entanto, o acesso ao farol é mantido fechado ao novato, que
se torna cada vez mais curioso com este espaço privado.
Avaliação:
IMDb:
8,0
Rotten:
92%
Metacritic:
83%
Filmow
(média geral): 4,0
Adoro Cinema
(usuários/adorocinema): 3,5/5,0
Kontaminantes
(Matheus J. S.): 8
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