Soul é indiscutivelmente a animação com maior hype da temporada.
Entretanto, longe dos luxuosos holofotes da Pixar existe um outro filme animado
que também merece atenção: Wolfwalkers.
A priori, o longa logo de cara se realça pela forma singular com que
Tomm Moore e Ross Stewart o conduzem. Ambos constantemente brincam com o
formato de tela, diminuindo-a, mostrando cenas distintas simultaneamente e
apresentando o feudo que compõe o cenário da trama sob uma extensa amplitude
panorâmica. O jogo de luz e sombra igualmente se destaca criando enquadramentos
simbólicos que dizem muito acerca do âmago das figuras em tela. São, sobretudo,
fatores que atribuem uma assinatura à obra, além de fugirem de padrões clássicos
do gênero.
O ritmo tonal da película também atesta a proficiência da direção. O
primeiro ato é bastante hábil ao expor, de forma ágil e inteligível, a riqueza
de detalhes que compõem a mitologia do enredo, ao passo que apresenta os
personagens centrais e os parâmetros que irão ditar os principais conflitos
subsequentes. Outrossim, Tomm e Ross são certeiros na concepção de momentos épicos
que remetem a renomadas produções audiovisuais em live-action, e no
equilíbrio de pontuais curvas dramáticas que não destoam do tom panglossiano
que fundamenta o entrecho.
Por sua vez, os traços do filme são característicos de desenhos feitos à
mão, o que contrasta com a estética popular das animações de grandes estúdios.
Dito isso, a identidade visual deste é projetada através da confecção de cenários
tomados por uma aura onírica corroborando a ambientação bucólica do século
XVII. Nesse sentido, o longa tem uma roupagem medieval que se manifesta no
estilo de vida dos personagens e faz alusão a séries de época, tal como Game of
Thrones. Ademais, o elemento fantasioso não deve ser esquecido, haja visto que
os aspectos imagéticos sofrem influência da atmosfera fantástica que, por
conseguinte, engendram sequências belíssimas.
Acima de tudo, Wolfwalkers é uma ode à cultura irlandesa, tendo como
pano de fundo importantes debates sobre a posição social feminina e a estrutura
da comunidade feudal. O folclore irlandês serve de alegoria à temas mais
encorpados, podendo-se traçar paralelos à famigerada caça às bruxas da Idade
Moderna e as diversas perseguições lideradas pela Igreja Católica.
Posto isto, cada personagem exerce um papel significativo para ilustrar
um dos períodos mais sombrios da história da humanidade: a plebe simboliza o
medo irracional de um povo oprimido pelo clero; os lobos são a personificação
do desconhecido; o vilão incorpora a tirania e o fanatismo religioso; Mebh
corresponde às "bruxas" (não à toa seu cabelo é ruivo, considerando
que esta classe foi majoritariamente caçada durante a Inquisição) e Robyn
representa as milhares de mulheres que cresceram submetidas à uma vida de
servidão e afazeres domésticos. Como adendo, o fogo é utilizado como arma pelos
antagonistas em referência às fogueiras usadas para queimar os condenados por
bruxaria na época.
Por fim, Wolfwalkers desperdiça a oportunidade de arquitetar manobras
arrojadas em momentos cruciais da trama, optando, em contraparte, por
alternativas mais passivas que irão agradar o público de modo geral. Todavia,
sua estória enternecedora repleta de significâncias e um fecho otimista fazem
desta uma obra relevante que certamente não deve ser perdida.
Matheus J. S.
Assista e
Kontamine-se
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Ficha Técnica:
Data de lançamento (Brasil): 11 de dezembro de
2020
Direção: Tomm Moore e Ross Stewart
Elenco: Sean Bean, Simon McBurney, Maria Doyle
Kennedy…
Gênero: Animação
Nacionalidade: Reino Unido, Irlanda e França
Sinopse
(Adoro Cinema):
Em uma época de
superstição e magia, quando os lobos são vistos como demoníacos e a natureza um
mal a ser domado, Robyn, uma jovem caçadora aprendiz, vai para a Irlanda com
seu pai na tentativa de eliminar um último bando. Quando a jovem salva uma
garota nativa selvagem, sua amizade a leva a descobrir o mundo dos Wolfwalkers,
transformando-a na mesma coisa que seu pai tem a tarefa de destruir.
Avaliação:
IMDb: 8,1
Rotten: 99%
Metacritic: 87%
Filmow (média geral):
4,3
Kontaminantes (Matheus J. S.): 9
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