Após dois longas japoneses, um norueguês, um mexicano e um alemão, está na
hora de discutir sobre o cinema finlandês. Posto isto, Compartment N°6 será o
intermediário da conversa.
Em primeira análise, Compartment N°6 tem algumas características que merecem
destaque. O filme abre com um plano de aproximadamente um minuto onde o diretor
passeia de um cômodo ao outro seguindo a protagonista Laura. Neste, já se
estabelece uma câmera over the shoulder que será predominante ao correr
de toda a estória, esta usada para imprimir intimidade entre o público e a
personagem. Vale ressaltar que a câmera na mão é outro traço tão logo imposto,
sendo que o recurso é fundamental para instituir uma atmosfera quase amadora
que, sobretudo, dialoga com o tom recordatório da película.
Nesse sentido, Compartment N°6 é um filme que fala sobre reminiscências.
Assim, a fotografia escura e granulada e a textura crua da imagem são recursos
visuais empregados com o intuito de fazer com que a obra pareça mais velha do
que realmente é. Nesse sentido, embora não seja declarado em instante algum, o
longa representa um carinhoso fragmento mnêmico, o que justifica o realce simbólico
de uma filmadora na urdidura e a censura de palavrões como se Laura
quisesse omitir as coisas sujas de suas lembranças. Por conseguinte, para se
compreender a relevância de tais memórias na vida da protagonista, é pertinente
notar como desde o princípio o enredo articula a ausência de felicidade na sua
rotina.
Desse modo, ainda que Laura afirme ter um relacionamento pleno com sua
parceira e estar realizando aquela viagem por paixão, a película concebe uma
personagem que manifesta constante incômodo por meio de feições que não podem
ser disfarçadas. É partindo dessa premissa que um improvável colega de
compartimento se mostra a solução para um problemático capítulo da jornada de
Laura. Dito isso, a produção acompanha com bastante doçura o desenvolvimento de
laço entre dois desconhecidos, ganhando força pela similaridade com que os
eventos expostos podem ter com algum episódio da vida do próprio espectador,
afinal, quem nunca se afeiçoou à uma pessoa em um encontro fortuito e nunca
mais a viu?
Dessarte, a inserção de Ljoha é crucial para o progresso da trama.
Primordialmente, ele é uma incógnita, remetendo até a um criminoso ou homem
depravado, e, mesmo que muitas perguntas ao seu respeito permaneçam sem
resposta, o filme é eficaz ao instituir o seu significado para Laura. Em decorrência,
o palco narrativo constituído pela claustrofobia de uma pequena seção de um vagão
de trem permite que os personagens encontrem um no outro o ar que precisam. Em
função disso, tendo em vista que os melhores trechos da obra são frutos da orgânica
interação entre as principais figuras em tela, o filme perde o viço quando Ljoha
não está em cena. Isso acontece por conta dos mistérios que rondam sua
personalidade e devido a incrível dinâmica que os atores possuem atuando em
conjunto.
Em suma, Compartment N°6 opta por uma narrativa onde a jornada é mais
importante do que o destino, proporcionando, em consequência, uma experiência
que pode ser a entrada de muitos assistentes para o vasto cinema finlandês.
Matheus J. S.
Assista e Kontamine-se
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Ficha Técnica:
Data de lançamento (mundial): 2021
Direção: Juho
Kuosmanen
Elenco: Seidi Haarla, Yuriy Borisov, Dinara Drukarova...
Gênero: Drama
Nacionalidade: Finlândia
Sinopse (Filmow):
Enquanto um trem segue seu
caminho até o círculo ártico, dois estranhos compartilham uma jornada que
mudará suas perspectivas de vida.
Avaliação:
IMDb: 7,4
Rotten: 87%
Metacritic: 78%
Kontaminantes (Matheus J. S.): 9
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